segunda-feira, 2 de abril de 2012

Honestidade

‎"A honestidade não precisa marcar os outros. Basta ser uma marca em você".
Curta-metragem produzido na Av. Paulista em São Paulo por um grupo de amigos interessados em resgatar valores importantes para a sociedade que se perderam ao passar do tempo.
Este vídeo traz uma reflexão sobre a verdadeira essência de ser honesto.

Honestidade from Valores on Vimeo.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Eu sou sim e sou não; assim e não eu sou não sou

Caio Fábio

Coisa muita estranha é esta de ser um homem divinamente caído e caidamente divino!

Sim, de carregar o finito e o infinito;

de ser mortal e eterno;

de ser animal mamífero e um deus filho de Deus;

de ser livre para escolher e condicionado a tantas determinações que turvam a escolha;

de ter arbítrio e também de reagir à revelia do arbítrio;

de ser santo na mesma natureza pecadora e caída;

de estar preso ao tempo/espaço e já poder transcendê-lo até pelo pensar, pelo imaginar e pelo crer;

de contar dias sabendo da eternidade;

de ter apegos mortais enquanto se celebra o eterno;

de sentir separações que sabemos não separam;

de temer amar quando a vida que é [...], é apenas amor;

de adiar a morte quando é justamente ela que nos livra dela própria;

de temer a libertação daquilo que de fato liberta;

de amedrontar-se do que não pode matar;

de esperar frustrado o que já se sabe que é;

de relutar em ter fé Naquele que teve fé em nós por nos ter feito de nada além do Seu próprio desejo;

de andar nas calçadas de poeira esquecido do Caminho;

de buscar fora [...] a Verdade que existe apenas dentro;

de almejar a Vida como se ela não nos habitasse;

de invocar Deus acima e não no interior;

de separar os semelhantes sem enxergar a obviedade da nossa mesma semelhança;

de nos impressionarmos ainda com tudo o que não passa de miragem;

de atribuirmos direito duradouro ao que se desvanece;

de sairmos para lutas que estão já acabadas;

de nos abalarmos com aquilo que já carrega o signo da falência;

de confessarmos com gritos o que na vida não cremos;

de pregarmos em alaridos e não desejarmos viver nem mesmo em silêncio;

de pensarmos e não concluirmos que quase nada cabe no pensamento;

de habitarmos o finito do tempo/espaço e não nos darmos conta de que até em seus limites nada vemos;

de aceitarmos estatísticas e tergiversarmos ante a sabedoria;

de nos culparmos do que não provocamos;

de não culparmo-nos pelo que fizemos;

de justificarmo-nos do que não requer nada além de consciência e mudança;

de aceitarmos que um conjunto de arrazoados tenha o suposto poder de salvar a uns e condenar a outros;

de confessarmos a inalcançabilidade de Deus e Lhe defendermos os templos;

de carregarmos em nós o pode do louvor e imaginarmos que ele não acontece se não cantarmos;

etc… — enfim, de sabendo tudo isto acerca de nós mesmos, vivermos como se nada disso fosse o que de fato é!

Assim, não me é possível deixar de pensar que a maior tragédia humana é o medo de crer, de ver, de saber, de aceitar os limites e de acolher os não limites; de ser tão maravilhosamente divino em sua origem, e tão desgraçadamente mamífero e animal em suas escolhas; de ser sobejamente elevado e, ao mesmo tempo, tão aferrado ao que é mesquinho; de ser tão para além das estrelas enquanto briga com tanta avidez pelos espaços feitos de pó!

Ah! Que desgraçadamente linda e patética é a existência humana!

E que grande amor é esse que assim me ama?

Por isto, também digo:

Deus é amor porque sei que eu assim sou [...], tão aquém de todo amor!

Sou [...], logo sou; e não sou a origem do ser que sou; sou sem poder ser; sou porque sou aceito em meu ser; por isto sendo quem e como sou, sei que Quem me fez só pode ser Absoluto Amor!

E que grande loucura é esta, a de Deus, que decidiu nos chamar Seus filhos?

Ora, sendo nós assim, tão sem nada definidamente assim, como seríamos objeto de qualquer coisa que não absolutamente e apenas o Sim da Graça?

Nele, que é Sim Assim Somente Sempre Amor,

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Quem são os vencedores felizes de hoje?

por Tais Machado



Daniel Cohen é um economista, também professor da École Normale Supérieure, vice-presidente da École d’Économie de Paris e editorialista do jornal Le Monde. Mas, o que mais me impressiona é sua capacidade de falar sobre temas não tão simples, mas com uma linguagem apetitosa. Você o lê e compreende conceitos não tão básicos com certa facilidade e até fica com a sensação de que entende de economia.

Recentemente foi publicado no Brasil mais um de seus bons livros, e esse, mais atualizado (escreveu no ano passado) – "A Prosperidade do Vício". São artigos que nos convidam a uma reflexão mais profunda de nosso tempo.

Num dos capítulos ele questiona: “se a riqueza é um elemento importante do bem-estar, por que uma sociedade que enriquece parece fracassar em tornar seus membros mais felizes?”. E pondera: “Os franceses eram incomparavelmente mais ricos em 1975 do que em 1945, mas não eram mais felizes. Por que tanto desgosto? A resposta é simples. O bem-estar dos modernos não é proporcionado pelo nível de riqueza. Depende do seu crescimento, qualquer que seja o ponto de partida desta”. E salienta “um traço fundamental da sociedade moderna: seu apego ao crescimento”.

Interessante pensar a esse respeito no contexto brasileiro, com uma economia estável nos últimos anos e com perspectivas de crescimento maior. Os cidadãos estão mais vorazes? Apesar da tentativa do Governo de conter a euforia consumista de fim de ano, com aumento de juros, a fim de que a inflação não aumente de forma avassaladora, ainda assim percebemos as pessoas animadas em consumir mais.

Voltando aos comentários do Cohen, “o consumo é como uma droga. O consumo cria uma dependência. O prazer que proporciona é efêmero, mas o desespero é imenso quando nos vemos privados dele”. Entretanto, considera pesquisas recentes que apontam que “90% dos mais ricos respondem que são ou muitos felizes ou o suficiente, enquanto apenas 65% dos mais pobres respondem que o são. Aqueles que têm uma vida financeira mais folgada são sempre majoritariamente muito felizes”.

Como se explica isso? Nas palavras de Cohen trata-se de “um fenômeno simples e eterno: a inveja. Sentimos prazer em conquistar mais do que os outros. Marx já tinha feito essa observação: ‘Uma casa pode ser grande ou pequena, mas enquanto os vizinhos tiverem casas do mesmo tamanho isso não será um problema. Se alguém constrói um palácio do lado, essa casa se tornará minúscula’. Cada um tentará ultrapassar seus colegas ou amigos, aqueles que formam o ‘grupo de referência’ com o qual nos comparamos”.

Constata-se, assim, que mais do que acumular riquezas o que importa hoje é sentir-se superior ao próximo. Sente-se um vencedor quando se percebe na frente do outro, o esforço é ter e estar em vantagem em relação aos que o rodeiam. Parece que tudo o que importa é a competição nessa selva capitalista.

Pensar sobre o registro que Lucas faz no evangelho da história de Zaqueu me parece oportuno. Afinal, Zaqueu é um homem rico, em grande vantagem financeira em relação ao seu grupo de referência – seus irmãos judeus. Como chefe dos cobradores de impostos, não era bem quisto pelo seu próprio povo, contudo, preferiu ou agradou-se mais da opção de obter larga vantagem financeira, ainda que extorquindo seu próximo. Talvez a sensação de ser um “vencedor” por suas conquistas até ali lhe bastavam. Podia ser pequeno em estatura, mas era grande no poder que as riquezas lhe davam.

A curiosidade para saber quem era Jesus, para ver aquele que atraia multidões o fez subir numa árvore. E ali foi encontrado por Jesus. Depois desse encontro se tornou um novo homem, mudando radicalmente sua postura.

É interessante porque não temos detalhes da conversa que Jesus teve com ele enquanto ficou em sua casa. Mas vemos o efeito em sua vida. Espontaneamente ele diz: “Olha, Senhor! Estou dando a metade dos meus bens aos pobres; e se de alguém extorqui alguma coisa, devolverei quatro vezes mais” (Lc 19.8). E como Jesus reage diante de tal atitude? “Jesus lhe disse: ‘Hoje houve salvação nesta casa! Pois o Filho do homem veio buscar e salvar o que estava perdido’.” (Lc 19.9-10).

Ao que parece, segundo Jesus, a salvação se manifesta na vida das pessoas quando o arrependimento acontece, quando a consciência é ampliada, quando seus olhos interpretam a realidade de uma nova maneira, quando seu coração vê o que antes não via, quando o próximo não é mais seu competidor, mas alguém com quem você se torna solidário, te levando a doar, a devolver, a ajudar. Como diz Philip Yancey “Jesus me convida a abandonar o esforço competitivo. Convida-me a confiar na opinião de Deus a meu respeito, a única que vale afinal de contas”.

Jesus diz que sua vinda foi para buscar e salvar o perdido. Ele diz isso justamente para Zaqueu, cuja atitude prática evidenciava a descoberta de ter sido achado e salvo. Sim, precisamos ser salvos de nós mesmos.


Taís Machado é psicóloga e docente em diversos seminários teológicos.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

A fotossíntese da fé e o estranho evangelho hidropônico gospel

Todos nós que um dia passamos pelas séries iniciais da escola temos o ciclo da fotossíntese gravado como tatuagem em nossas lembranças de infância. Pois, mesmo assim, permita-me recordá-lo: fotossíntese é isto.

Resumindo [já que você não acessou o link da Wikipédia mesmo]: Seria a fotossíntese algo além de uma planta usar da luz solar e da água para transformar um gás poluente e perigoso como o gás carbônico em oxigênio essencial para a vida alheia e ainda alimentar a planta com sais minerais presentes no chão, na terra, no húmus? [Sim, o processo está muito simplificado, mas farei uma simples analogia, não um tratado ponto-a-ponto da coisa. Sigamos]

Ora, o que é a caminhada na vida cristã além de uma metáfora metafísica desse surpreendente processo vegetal?

Vejo na jornada da fé cristã [aquela uma proposta pelo Jesus Nazareno] um processo semelhante. Se não é a fé cristã usar de dúvidas, questionamentos, incertezas, terríveis vagos nas páginas do nosso manual da vida para, junto com a luz vinda do Filho do Homem, junto com a água que mata toda a sede, se não é a fé cristã usar tais dúvidas para gerar vida, e vida em abundância, o que mais seria?

Nisso, vejo um grave problema com a atual cultura, ou agricultura, evangélica. Se Jesus foi ao mundo, pisou em terra viva, tomou as dores nossas para si; ou seja, se Jesus nos faz a fotossíntese necessária para vivermos, como rejeitar esse processo? Ou pior, como propor um simulacro substitutivo?

Voltemos às analogias. Já ouviu falar em agricultura hidropônica, ou hidroponia? É um simulacro científico da agricultura em terra, é um experimento científico, controlado e metódico que pretende gerar vida em ambiente esterilizado, livre de germes, bactérias e outros micro-organismos da mesma monta. Pior, é agricultura sem chão, sem terra, sem minhocas e cheiro de mato. É uma coisa estéril, fria, repetitiva, com alfaces de folhas iguais, com tomates todos redondinhos, meigos e de coloração, com moranguinhos docinhos e limpinhos.

Já comeu um tomate hidropônico? Vá à papelaria mais próxima e morda uma farta placa de isopor. O gosto será o mesmo, acredite. A tal agricultura hidropônica cria vegetais de granja, numa metáfora fácil. É um simulacro, é uma reprodução fajuta de algo vivo, bom e agradável.

O que nos leva ao final da metáfora: estão fazendo o mesmo com a fé cristã nas igrejas evangélicas brasileiras. Em vez de uma fotossíntese completa, propõem um evangelho igualmente estéril, sem chão, sem terra, sem húmus; um evangelho limpinho e bonitinho, boas novas de reality show, com um monte de regras e um ser que tudo vê destemperado e louco para, ao menor deslize, nos eliminar da casa e nos mandar ao inferno dos desviados e rebeldes.

Os evangélicos morrem de medo de se contaminar de mundo, de chão, de terra. Querem ser sal diet, que não aumenta a pressão, mas também não salga, não conserva, não afasta a podridão; querem ser luz halogênica, que não de desgasta, não consome energia, mas, em compensação, não arde, não queima, não aquece, não incomoda.

Vivem os evangélicos hoje de máscaras [com todos os trocadilhos possíveis], vivem de luvas cirúrgicas e germicidas, álcool gel e antibióticos enquanto, de agricultores da vida, se tornam cientistas do cultivo suspenso, da cultura esterilizada, da agricultura hidropônica.

Ah, mas é o fim dos vermes, das larvas, das doenças e pragas na lavoura. É o fim do joio misturado ao trigo. Não, não é. Ou melhor, é. Mas, tirando as intempéries, os percalços, os ataques, tiram a força, a resistência, o crescimento vigoroso. Hoje, as igrejas evangélicas geram tomates bobões, babões e bundões. Geram abobrinhas, alfaces sem gosto, frutos sem sabor. Geram um simulacro e, pior, geram em pouca monta simulacros a custa de tempo, esforços e recursos suficientes para grandes lavouras naturais, para verdadeiros alimentos serem produzidos, vivos, sadios e saborosos.

Por fim, sinto pena de ver tanta gente cultivando feijões em algodão e crendo que são ceifeiros, mais pena sinto dos frágeis brotos estéreis, sem vida, sem chão, sem história, sem caminhada. São frutos em estufas, em bolhas de contenção, em redomas de vidro sem contato com nada e sem chance de crescer e se multiplicar. Esqueceram-se das palavras do Rabi: O reino dos céus é semelhante ao homem que semeia a boa semente no seu campo (Mateus 13.24).

[texto dedicado a Ricardo Gondim, cujos livros e textos com cheiro de terra e chuva me encheram de dúvidas, tiraram todas as minhas certezas e me levaram a uma fé cristã cristalina]

Tom Fernandes, no blog Pequenos dramas de um escritor diletante

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Uma opinião contrária à minha não é um teste de fé

Publicado por Jarbas Aragão em 19 de maio de 2011.

Texto de Mark Galli, editor da revista Christianity Today

Tive uma série de conversas ultimamente nas quais acabávamos falando sobre o livro Love Wins, de Rob Bell. Todas as vezes, uma estranha dinâmica parecia se repetir. Se a pessoa havia lido minha resenha sobre a obra ou sabia das minhas críticas, hesitava em elogiar o livro. O primeiro passo nesse ponto é dizer: “Não concordo com tudo no livro, mas…” – e o que segue é entusiasmo quase total. Normalmente, nutrem simpatia maior por uma ou outra parte da obra. É como se alguém se sentisse culpado por ter gostado da leitura. Talvez as pessoas que realmente gostam do livro sequer se preocuparam em falar comigo, mas suspeito que haja algo mais acontecendo.

Quem sabe seja algo que uma amiga jornalista e cristã me disse: é preciso ter cuidado toda vez que seescreve sobre Rob Bell, para que não o acusem de realmente gostar, ou de não gostar dele. Quando algumas pessoas falam sobre as ideias de Bell, parece que é preciso se desculpar por ler o livro ou concordar. Muitos parecem preocupados que, se gostarem do livro, sua teologia será questionada.

Resumindo: parece que Rob Bell está se tornando a “prova dos nove” da fé atual. Se você gosta dele, sua ortodoxia pode ser questionada. Se você quiser provar suas credenciais ortodoxas, basta simplesmente condenar o livro.

Esse fenômeno é real, mas é uma bobagem. Isso não significa que não seja uma corrente poderosa. E por mais que seja verdade, é uma corrente contra a qual devemos nadar contra.

Em primeiro lugar, Rob Bell ama Jesus. Ele quer ver muita gente crendo no Senhor. Ele deseja ver o mundo transformado em nome de Jesus. Ele realmente pensa que a Bíblia é o livro através do qual Jesus fala com autoridade. Ele acredita em milagres. Ele acredita que Jesus voltará. Poderia continuar a lista… Rob Bell compartilha de muitas das crenças tão estimadas pelos evangélicos. Em suma, ele é um irmão em Cristo.

Naturalmente, só porque alguém é irmão não significa que devemos aceitar tudo o que ele diz. Irmãos discordam, algumas vezes sobre coisas importantes. De vez em quando as maiores discórdias acontecem dentro das famílias. Entretanto, continuam sendo uma família – a não ser que uma parte decida repudiar o resto da família.

Segundo, fazer de Bell uma “prova dos nove” é hipocrisia. Há alguns livros entre os best-sellers cristãos que ensinam algo estranho, mas não entramos em pânico como muitos fizeram em relação a Love Wins. Provavelmente, o material mais controverso recentemente foi A Cabana. Sem dúvida, existem algumas ideias teologicamente problemáticas naquele livro, mas na maioria das vezes os evangélicos têm “perdoado” Paul Young e sua teologia em favor da temática mais ampla do livro: a redenção em Cristo. Reconhecemos que um autor tentando contar uma velha história de novas maneiras algumas vezes ultrapassará os limites da teologia tradicional. Mas a maioria de nós não julga a ortodoxia alheia baseado apenas em sua reação ao livro A Cabana. Sabemos que as pessoas leem e reagem a livros como esse de diferentes maneiras, e não parecemos nos importar muito com isso.

Em terceiro lugar, acredito que não temos alternativa a não ser ouvir e responder cordialmente às ideias que já foram resolvidas no passado, ideias que nos fazem sentir desconfortáveis, ideias que parecem ameaçar nossa fé. Entramos em uma nova era na história da Igreja, a “era da internet”, na qual todo tipo de crença pode ser conhecida com apenas um clique. Somos virtualmente vizinhos de católicos, hindus, muçulmanos, ateus, arianos, pelagianos, universalistas e assim por diante. E seus sites frequentemente apresentam aspectos que, em uma escala maior ou menor, diferem da nossa visão do Cristianismo – e eles expressam esses aspectos de forma razoável e convincente. Não podemos mais sair chamando as pessoas de “universalista” ou “ariano” e pensar que isso é suficiente.

Vivemos em uma época em que devemos nos envolver novamente com todas essas brigas sobre ortodoxia, heterodoxia, heresia, paganismo e apostasia? Aprecio a oportunidade de interagir com pessoas de tradições diferentes e quero ouvir o que elas têm a dizer. Se nossa fé cristã não pode resistir aos argumentos, devemos rever isso assim que pudermos. Mas, bem, não há realmente nada novo debaixo do sol. O que temos agora é uma oportunidade divinamente ordenada para esclarecer o que acreditamos em meio a um mundo extremamente pluralista. Afinal, o mundo da igreja primitiva era tão pluralista quando o nosso, e a igreja administrou isso muito bem, obrigado.

Isso significa que teremos de nos acostumar com alguns cristãos de carteirinha experimentando ideias que pessoas como eu consideram pouco úteis. Mas se um escritor tenta fundamentar seus argumentos nas Escrituras, e se identifica como membro do corpo de Cristo, a misericórdia requer que eu primeiramente o ouça com humildade. Quem sabe o que Deus quer nos dizer neste momento? Não devo apenas ouvir o argumento, mas também perceber o problema que ele está tentando resolver. Pouquíssimas pessoas apresentam um novo modo de ver uma doutrina, a menos que estejam tentando resolver um problema real na igreja.

Em Love Wins, Bell discute alguns temas bíblicos (Julgamento Final, Expiação etc.) porque acredita que o modo que tradicionalmente falamos sobre esses temas não é fiel à Bíblia e afasta as pessoas de Jesus. Acredito que ele está parcialmente certo e que na maioria das vezes o modo como falamos sobre expiação vicária e inferno não é 100% bíblico. Portanto, essas doutrinas causaram mais problemas do que resolveram. No entanto, acredito que a solução que ele defende prejudicará o desejo de ganhar pessoas para Jesus. Além disso, o problema principal com Love Wins é que as Boas Novas são ainda melhores – mais profundas, ricas, complexas – do que o livro deixa transparecer. O fato de Bell apresentar uma perspectiva decididamente menor não faz dele um herege, embora possa ser antibíblico em alguns pontos. O ônus da prova recai sobre seus ombros. E o fato de que muitos concordam com as preocupações de Bell sobre esses temas mostra que precisamos discuti-los novamente.

Porém, não é uma boa ideia debater de forma infinita. Deus me livre! Fiz parte de duas importantes denominações protestantes ao longo de minha vida. Elas parecem pensar que o diálogo é um fim em si mesmo. Em muitos assuntos cruciais, mesmo depois de 30 anos de debates, eles relutam em permitir que o sim seja um sim, e que o não, um não. Certamente, para algumas pessoas, e ainda mais para igrejas e denominações, chega um momento de esclarecer e confirmar o que acreditam, por exemplo, sobre a expiação e o inferno. Mas se um livro é publicado e os comentários a seu respeito demonstram que milhares de crentes estão se debatendo com essas questões, o melhor é dar um passo para trás, ouvir atentamente as dúvidas e as preocupações, e exercer o amor.

Deveríamos cultivar uma atmosfera nas igrejas, famílias e sites na qual toda pergunta possa ser feita sem medo de julgamento, em que dúvidas teológicas são respondidas e não apenas rejeitadas. Algumas vezes agimos como se Jesus tivesse dito: “Eu poderia ser o Caminho, a Verdade e a Vida – a não ser que uma ideia melhor apareça”. Não. Podemos ter confiança plena em face de qualquer pergunta, porque sabemos que tudo que é verdade tem sua origem na verdade de Deus: em Cristo. Além disso, Jesus realmente é a verdade que nos liberta. Em muitos casos, isso exigirá disposição em ouvir e trabalho intelectual intenso. Mas quem disse que amar não implica em sofrimento?

Devemos nos tornar protestantes radicais de novo. Acreditamos que Deus é soberano e que o Espírito Santo nos guia em toda a verdade. Por meio de discussões e debates permitimos que a verdade de Deus em Cristo se aprofunde e se alargue. Se Jesus é realmente Senhor de sua igreja, sua verdade vai entrar na vida dela, de um jeito ou de outro. Nosso trabalho é ler as Escrituras, falar uns com os outros pelos laços do amor e, quando chegar a hora, tratar dos assuntos difíceis. Sei que uma congregação ou denominação tem todo o direito de dizer: “Esta conversa está terminada por ora. É nisso que acreditamos. Vamos avançar na missão fundamentados neste artigo de fé”. Existem momentos de dar nome aos bois, e dizer claramente que alguém tem uma falsa doutrina e está danificando a saúde da Igreja. Tudo isso faz parte do processo de seleção do Espírito Santo através da história. Mas não deveríamos terminar algumas conversas antes que elas tenham de fato começado, especialmente quando muitas vezes parece que o Espírito pode estar gerando de novo essa conversa preocupante.

Gostei muito do papo que tive com pessoas que leram Love Wins e também a minha resenha sobre o livro. Estou ansioso em ter mais conversas desse tipo. Elas reforçaram algumas das minhas ideias preconcebidas e me forçaram a repensar outras. Quando podemos conversar com irmãos em Cristo com liberdade e sem medo, com amor e sem julgar o outro, acredito que podemos amar a Deus mais profundamente. Existem maneiras talvez mais urgentes de amar o próximo neste mundo ferido, mas gerar divisão por causa de uma opinião diferente da minha definitivamente não é algo bom.

Tradução: Agência Pavanews